Empresa BR BPO foi contratada na gestão Bolsonaro; ministério apontou "prejuízos incalculáveis" e recomendou multa de R$ 2,9 milhões
Elza Fiuza/Agência Brasil
O Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC) investiga se a BR BPO Tecnologia, empresa contratada por R$ 58,3 milhões no governo Bolsonaro para gerir canais públicos de denúncias de direitos humanos, vazou informações sigilosas e violou regras de segurança. No ano passado, a área técnica da pasta recomendou uma multa de R$ 2,9 milhões e apontou “prejuízos incalculáveis” caso dados sigilosos fossem vazados.
Sediada em Brasília, a BR BPO assinou um contrato em novembro de 2019 com o MDHC, na gestão Damares Alves. Até junho de 2023, no mandato Lula, a firma operará os canais Disque 100, o Disque Direitos Humanos, e Ligue 180, a Central de Atendimento à Mulher.
Consideradas um “pronto-socorro”, essas centrais recebem denúncias anônimas sobre violações de direitos humanos. A ligação é gratuita. Por 24 horas por dia e sete dias por semana, a pasta encaminha as informações a órgãos de investigação para apurar os crimes relatados contra grupos vulneráveis, a exemplo de idosos, crianças e população LGBT. No caso da violência contra a mulher, o canal também indica locais para que a vítima possa ser acolhida, como delegacias especializadas.
Em abril de 2022, no terceiro ano do contrato de R$ 58,3 milhões, o ministério começou a apurar formalmente supostas irregularidades da BR BPO. No mês seguinte, uma nota técnica da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos recomendou multar a empresa em R$ 2,9 milhões por descumprir diversas regras. Entre elas: possibilitar acesso a informações confidenciais sem credenciais de acesso; armazenar os dados no exterior; e não se responsabilizar por vícios de proteção.
Em julho, um novo documento confirmou a recomendação da multa e apontou que o caso poderia trazer “prejuízos incalculáveis”. “Caso ocorra [vazamento de dados], seus prejuízos à imagem do serviço prestado nos canais Disque 100 e Ligue 180 e à dignidade das pessoas seriam incalculáveis”, escreveu o então coordenador-geral de Gestão do Disque Direitos Humanos, Reinaldo Las Cazas Ersinzon. O gestor citou ainda o risco do vazamento de imagens de abuso sexual.
“Pode ainda ter ocorrido vazamento para interesse comercial, inclusive com comércio de imagens de abuso sexual ou exploração de crianças e adolescentes que são recebidas com sigilo nos canais de atendimento para encaminhamento de apuração das autoridades competentes”.
Aberta em 2016, a empresa já recebeu R$ 202 milhões do governo federal e lidou com dados sigilosos de órgãos públicos de peso. Além do contrato atual com o MDH, já operou centrais de atendimento do Ministério do Trabalho e do Ministério da Educação.
Procurada pela coluna, a BR BPO não respondeu. O espaço está aberto para manifestações. No ano passado, a firma alegou ao Ministério dos Direitos Humanos que estava agindo com “todos os esforços possíveis para buscar uma solução”.
Procurado, o MDH afirmou que ainda não identificou o vazamento de informações sigilosas, mas acrescentou que a empresa comprometeu normas de segurança da informação nos canais de denúncias de direitos humanos. A pasta disse ainda que avalia multar a companhia.
“O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania não compactuará com a vulnerabilização de dados sigilosos. Atuaremos em observação aos parâmetros éticos e legais que sustentam a lisura da legislação brasileira, em compromisso com a verdade e a transparência pública. As vulnerabilidades do sistema serão enfrentadas a fim de que haja aperfeiçoamento dos serviços prestados em observância ao sigilo das informações”, seguiu o comunicado.