Quase lá: Senado afronta STF e aprova PL do Marco Temporal

Parlamentares da base do governo alertaram que proposta é inconstitucional e deverá ser vetada


Brasil de Fato | Brasília (DF) | 27 de Setembro de 2023 às 19:33


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O relator do projeto na Casa, senador Marcos Rogério (PL-RO), admitiu que alguns trechos mais polêmicos deverão ser vetados pelo presidente da República - Divulgação/Apib


Uma semana após o Supremo Tribunal Federal (STF) considerar ilegal a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas, o plenário do Senado aprovou na noite desta quarta-feira (27) por 43 votos a 21 o projeto de Lei que estabelece um marco temporal "turbinado".

O texto estabelece que só podem ser demarcadas terras indígenas que estavam ocupadas até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição, além de prever outros pontos polêmicos, como a retomada de terras indígenas em caso de mudanças culturais destes povos e a plantação de transgênicos nas áreas demarcadas.  

Ao longo da votação, parlamentares da base governista alertaram que a proposta é inconstitucional por, dentre outros motivos, tentar mudar um entendimento do Supremo Tribunal Federal por meio de um projeto de lei. Até mesmo o relator do projeto na Casa, senador Marcos Rogério (PL-RO), admitiu que alguns trechos mais polêmicos deverão ser vetados pelo presidente da República.

A votação ocorreu no mesmo dia que o Supremo Tribunal Federal estava concluindo o julgamento sobre o marco temporal e definindo detalhes sobre a matéria, como as eventuais indenizações de pessoas que receberam terras de boa-fé. 

"Por óbvio, presidente essa matéria será levada ao veto do presidente da República. Mesmo que os vetos sejam derrubados, por obvio, será acionada a Suprema Corte", afirmou o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Rede-AP). O senador Alessandro Vieira (MDB-CE) ainda criticou os discursos dos senadores que alegaram que algumas cidades poderiam até desaparecer caso seja mantido o entendimento do Supremo Tribunal Federal contra o marco temporal. 

"O cidadão brasileiro que está amedrontado com as narrativas de que cidades vão desaparecer está sendo enganado", afirmou, reforçando ainda que não é possível mudar o entendimento do plenário do Supremo por meio de um projeto de lei. "Qualquer criança sabe que não é possível, por projeto de lei, rever uma decisão dessa natureza", disse. 

"Preservado o núcleo central, existem pontos aqui que são escolha de governo", admitiu o relator Marcos Rogério (PL-RO). 

Antes da votação, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, declarou que a votação do texto na Casa não representa um "enfrentamento" ao tribunal e classificou o movimento do Congresso como "muito natural". Ele ainda afirmou que, desde que o projeto chegou da Câmara, ele deu encaminhamento da tramitação da proposta nas comissões. "Não houve da nossa parte nenhum açodamento para que o projeto fosse levado ao plenário", afirmou Pacheco.

O texto foi aprovado pela Comissão de Constituição de Justiça nesta quarta e enviado para o plenário que, no mesmo dia, aprovou um requerimento de urgência e votou a proposta.   

Para Bruno Taitson, analista de políticas públicas da WWF Brasil, porém, a tramitação foi muito acelerada e sem considerar a importância do tema que merecia ser discutido em outras comissões também. "Trata-se de um PL que tem impacto diretos sobre questões de Direitos Humanos e ambientais. No entanto, quem decidiu foi a Comissão de Agricultura e a CCJ, sendo que houve apenas uma audiência pública na Comissão de Agricultura, que aconteceu no mesmo dia da votação. Foi uma tramitação açodada que não condiz com a importância do tema", afirma. 

Edição: Thalita Pires

fonte: https://www.brasildefato.com.br/2023/09/27/senado-afronta-stf-e-aprova-pl-do-marco-temporal

 

Marco temporal: STF aprova indenizações a fazendeiros e descarta mineração em terras indígenas

Movimento indígena diz que Supremo definiu critérios que prejudicam demarcações

Murilo Pajolla
Brasil de Fato | Lábrea (AM) |
Juristas afirmam que indenizar fazendeiros vai atrasar demarcações - Foto: Lucas Kolesny

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que fazendeiros desapropriados em processos de demarcação de terras indígenas têm direito a receber indenizações prévias pelo valor total da terra, e não apenas pelas construções erguidas, como prevê a Constituição. 

O ministro Dias Toffoli abriu mão da proposição de dar prazo de um ano para o Congresso regulamentar a mineração industrial em terras indígenas. Com isso, permanece o entendimento atual, de que a atividade é permitida apenas com anuência do Congresso Nacional e das comunidades indígenas afetadas.

O entendimento consensual entre os 11 ministros foi firmado nesta quarta-feira (27), na continuação da análise do marco temporal das terras indígenas. Em julgamento histórico no dia 21 de setembro, a Corte rejeitou a tese jurídica ruralista por 9 votos a 2, mas deixou para esta semana a definição de pontos que poderiam subtrair direitos indígenas em favor do agronegócio. 

Em outra tese fixada pelo Supremo, ministros definiram que ampliação de terras indígenas só pode ser requerida dentro de cinco anos após a conclusão da demarcação original. Até então, não havia prazo, já que a Constituição reconhece de forma textual os direitos dos indígenas sobre suas terras como “imprescritíveis”. 

:: Em julgamento histórico, STF derruba marco temporal das terras indígenas por 9 votos contra 2 ::

O desfecho do julgamento do marco temporal também abriu espaço para que comunidades indígenas beneficiadas pela demarcação sejam realocadas.

O reassentamento, segundo tese fixada nesta quarta-feira (27), deve ocorrer apenas em caso de “absoluta impossibilidade” de manter os povos no território alvo do pedido de demarcação, respeitando os direitos indígenas previstos na convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil. 

"STF enterra Marco Temporal, define critérios prejudiciais aos povos indígenas de indenização para demarcação e retira debate sobre mineração em Terras Indígenas", avaliou a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) em postagem nas redes sociais. 

Como serão as indenizações

A proposta de indenizar fazendeiros pela terra nua – ou seja, por toda a propriedade, não apenas pelas construções erguidas – partiu de Alexandre de Moraes, mas era defendida há pelos menos 15 anos por latifundiários do Mato Grosso do Sul. O movimento indígena afirma que a nova base de cálculo pode inviabilizar demarcações, pois aumentam significativamente o valor das indenizações, em um cenário de baixa arrecadação estatal.

:: Entenda a indenização a fazendeiros em discussão no julgamento do marco temporal ::

"Nós defendemos que essas indenizações sigam o rito que determina a Constituição, que são as indenizações pelas benfeitorias de boa-fé. E que essas indenizações sejam feitas desatreladas de qualquer processo demarcatório e que isso não inviabilize as demarcações", disse na última Maurício Terena, coordenador jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).

O Supremo entendeu que os proprietários não têm direito a compensações financeiras caso a terra indígena já tenha sido reconhecida oficialmente em um processo demarcatório. Conforme defendia a Apib, o STF determinou que as indenizações ocorrerão de forma apartada do processo demarcatório. 

Supremo contrariou Constituição ao validar títulos de propriedade sobre terras indígenas

Juristas indígenas e não indígenas ouvidos pelo Brasil de Fato já afirmaram que o Supremo contraria a Constituição ao considerar passíveis de indenização títulos de propriedade particular emitidos sobre terras indígenas. 

Isso porque a Constituição considera, de forma textual, que esses títulos são nulos, portanto não deveriam ser reconhecidos pelo Estado. Por isso, a modalidade de indenizações vigente até então era calculada sobre benfeitorias de boa fé, ou seja, as construções erguidas no território sem a intenção de cometer ilegalidades.

:: Senador com fazenda sobreposta a terra indígena faz defesa do marco temporal na CCJ ::

"As indenizações propostas por Moraes rompem com o texto da Constituição. O voto dele cria uma fase nova para o processo demarcatório, que é a da indenização prévia, ou seja, antes da entrega da posse aos indígenas. A União teria que pagar indenizações antes de finalizar a demarcação, o que pode tornar o processo ainda mais moroso", explicou na semana passado o assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Rafael Modesto.

"Penduricalhos" do marco temporal eram impasse entre ministros

O julgamento de hoje (27) põe fim a um impasse entre ministros sobre temas complementares ao marco temporal das terras indígenas.

Luís Roberto Barroso e o relator Edson Fachin defenderam que o objeto da ação era apenas o marco temporal, mas a maioria dos ministros entendeu que também era preciso decidir a respeito das indenizações a fazendeiros. “Barroso afirmou que se as demarcações forem condicionadas às indenizações, “nunca vai se demarcar terra indígena nenhuma”.

“Não é uma boa ideia transformar esse caso na mãe de todas as batalhas envolvendo demarcação de terras indígenas. O caso concreto não envolve a maior parte das questões que estão sendo debatidas”, sustentou Barroso, que foi voto vencido na questão. 

Edição: Thalita Pires

fonte: https://www.brasildefato.com.br/2023/09/27/marco-temporal-stf-aprova-indenizacoes-a-fazendeiros-e-descarta-mineracao-em-terras-indigenas

 

 

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