Apesar dos avanços sociais e econômicos no Brasil nas últimas décadas, as mulheres negras ainda enfrentam uma série de desafios que comprometem sua plena participação na sociedade, impedem seu empoderamento econômico e segue perpetuando um histórico ciclo de pobreza.
Em 25 de julho celebramos o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. Como sabemos a data foi instituída em 1992, durante o 1º Encontro de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Afro-Caribenhas, realizado na República Dominicana. No Brasil é também o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, em homenagem à líder do quilombo Quariterê, que lutou contra a escravidão, no século XVIII.
A data nos traz a oportunidade de reconhecer e celebrar a contribuição das mulheres negras para a sociedade brasileira, além de refletir sobre os desafios ainda presentes na busca por igualdade e justiça. A luta e a resistência das mulheres negras têm raízes profundas e significativas, essas mulheres sempre foram presença fundamental e inconteste no movimento de emancipação da população afrodescendente, pautando as condições específicas de ser mulher e negra numa sociedade estruturada pelo sexismo e pelo racismo patriarcal.
Apesar dos avanços sociais e econômicos no Brasil nas últimas décadas, as mulheres negras ainda enfrentam uma série de desafios que comprometem sua plena participação na sociedade, impedem seu empoderamento econômico e segue perpetuando um histórico ciclo de pobreza. A interseção de gênero e raça coloca mulheres e meninas negras em extrema vulnerabilidade e sujeitas as mais diversas formas de violência, que se manifestam em todas as áreas, a discriminação: no mercado de trabalho, sub-representação política; acesso limitado a oportunidades educacionais, etc.
A educação é uma ferramenta fundamental para a transformação social, mas o acesso a oportunidades educacionais de qualidade ainda é restrito para a maioria das mulheres e meninas negras no Brasil. O sistema de cotas é uma política afirmativa importante e alçou à universidade muitas pessoas negras, porém, a discriminação racial é um importante obstáculos a impedir que mulheres e meninas negras alcancem níveis mais altos de escolaridade.
No mercado de trabalho, a desigualdade de gênero é uma realidade. No entanto, quando se considera a raça, a disparidade se torna ainda mais acentuada. Mulheres negras em idade laboral, em sua maioria estão na informalidade, ganham significativamente menos do que homens brancos e, frequentemente, estão relegadas a posições de menor prestígio e remuneração. Esta desigualdade não está relacionada apenas a questão de discriminação direta, mas também ao acesso restrito as oportunidades de qualificação e avanço profissional, afetando, assim, a qualidade de vida de mulheres negras.
A sub-representação de mulheres negras na política brasileira é outro reflexo da desigualdade estrutural. Apesar de constituírem o maior grupo populacional no país (cerca de 60 milhões de pessoas), sua presença em cargos eletivos é mínima. A ausência de mulheres negras em posições de poder impede que suas necessidades e perspectivas sejam adequadamente tratadas nas políticas públicas. Isso perpetua um ciclo de exclusão e marginalização difícil de romper sem ações afirmativas e políticas inclusivas.
O aumento alarmante da violência contra mulheres e meninas negras no Brasil reflete o racismo sistêmico presente na sociedade. Os dados mostram que as mulheres negras são as principais vítimas de feminicídios, violência sexual, mortalidade materna, violência obstétrica. A combinação de machismo e racismo agrava a situação, resultando em uma maior exposição à violência física, psicológica e sexual. Essa violência é muitas vezes invisibilizada e subnotificada pelas autoridades, dificultando a criação de políticas públicas eficazes para enfrentá-la.
Embora tenhamos avançado em diversas áreas sociais, os desafios enfrentados por mulheres e meninas negras continuam a ser profundos e multifacetados. A violência de gênero e racial, a discriminação no mercado de trabalho, a falta de representação política e o acesso limitado a oportunidades educacionais são problemas interligados que necessitam de abordagens integradas e interseccionais. Somente com um compromisso coletivo e políticas públicas direcionadas será possível criar um ambiente verdadeiramente igualitário para mulheres e meninas negras, na sociedade brasileira.
A luta por igualdade e justiça para essas mulheres e meninas no Brasil é contínua e exige o envolvimento de toda a sociedade. É essencial reconhecer e combater as raízes históricas e estruturais da discriminação para construir um futuro mais justo e equitativo para nós mulheres e meninas negras.
Maria Sylvia de Oliveira
Advogada; diretora e coord. da área de Gênero, Raça e Equidade de Geledés-Instituto da Mulher Negra