As aulas ministradas pela professora e doutora Ana Prestes são totalmente online e iniciam no dia 10 de março
A Escola As Pensadoras(@aspensadorasoficial) promove o curso A Formação Patriarcal do Brasil, ministrado pela professora e doutora Ana Prestes. As aulas abordarão como os traços do patriarcalismo podem ser encontrados em toda a formação social e cultural do Brasil.
"Existe uma variedade de termos e temas ligados ao feminismo, entre eles está o patriarcado, que em poucas palavras quer dizer um sistema social que favorece os homens. A cultura, estrutura e relações são sempre melhores para os homens, deixando as mulheres em um lugar desvantajoso, com poucos direitos e sendo submetidas às violências por causa do seu gênero", explica Ana Prestes.
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Segundo a professora, não se sabe quando o vocábulo patriarcado começou a ser utilizado, mas há registros da palavra no código Hamurabi, da antiga Mesopotâmia, do século 18 antes de Cristo: “(nessa época) Já usava o termo e designava a necessidade de controle das mulheres em uma sociedade patriarcal”.
Ana é pesquisadora da história da participação política das mulheres no Brasil, e inclusive, é autora e organizadora do livro 100 Anos da Luta das Mulheres pelo Voto - Argentina, Brasil, Uruguai, do Instituto E Se Fosse Você?, publicado em 2021. Em suas aulas, ela trará um panorama histórico de como foi formado o sistema patriarcal brasileiro, começando pelo período de colonização do Brasil, quem eram as mulheres dessa época? Como eram tratadas? E indo até os dias de hoje, em que será que podemos afirmar que é o século das mulheres?
O curso tem carga horária de 20h, é totalmente online e será transmitido pela plataforma Google Meet. O valor da capacitação é de R$ 135,00 para profissionais e R$ 85,00 para estudantes. Associadas da Escola As Pensadoras podem fazer o curso gratuitamente. Serão seis dias de aula que acontecerão às sextas-feiras e sábados do mês de março, a partir do dia 10. Todas as participantes receberão certificado. As aulas serão mediadas por Rita Machado, professora, doutora e idealizadora e coordenadora geral da Escola As Pensadoras.
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No site é possível fazer a inscrição e conferir toda a ementa do curso.
Abaixo, de forma bem simples e direta, a professora e doutora Ana Prestes explica um pouco sobre o termo e seus significados:
Como explicar para uma pessoa leiga o que é o patriarcado?
A palavra patriarcado vem do grego, a partir da combinação de duas outras palavras: pater (pai) e arkhé (de onde vem todas as coisas). O patriarcado, portanto, - e assim explicamos para as pessoas leigas -, se refere a um grupo ou uma sociedade inteira em que o domínio sobre todas as relações está centralizado na autoridade do pai, do homem, da figura masculina. Todas as coisas vêm do pai e todas voltam para ele. Ele é o centro, fonte e destino de tudo.
Quando surgiu a nomenclatura?
Não se sabe exatamente, mas o uso é muito antigo e aparece em códigos, leis, textos bíblicos e religiosos ao se referirem a autoridades masculinas e estruturas patriarcais de organização social.
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Qual o equívoco mais comum que acontece com a palavra?
Um equívoco que ocorre com o uso da palavra patriarcado é destituí-la de seu sentido histórico e social e tentar atribuir ao feminismo seu uso para um ataque gratuito aos homens que fazem parte do cotidiano de todas as pessoas, sejam pais, irmãos, maridos, tios, avôs. Ao identificar e interpretar as sociedades patriarcais não se está sugerindo uma guerra das mulheres contra os homens, mas sim uma conscientização de toda a sociedade sobre sistemas de opressão que podem ser de gênero, raça, de classe, orientação sexual, e todos estão interconectados.
Por que as pessoas não gostam de falar de patriarcado?
As pessoas que não gostam de falar de patriarcado fazem parte de segmentos da sociedade que também não gostam de falar de feminismo, seja porque não percebe a relevância do debate, porque não concebe o sofrimento e a opressão a que as mulheres são submetidas ou simplesmente porque entende que esta forma de organização social patriarcal está de acordo com a cosmovisão de sua religião, de sua família ou grupo social e assim deve permanecer, intocável como algo sagrado.
Exemplos de patriarcado
A igreja católica e as demais religiões são exemplos de patriarcado, em que a máxima autoridade sempre é exercida por homens. Nossas sociedades, como a brasileira, são exemplos de patriarcado, basta olhar para o histórico de autoridades políticas e sociais que temos, a legislação de controle do corpo das mulheres, os índices de violência de gênero.
O que é o patriarcado no Brasil?
No Brasil, o patriarcado, ou o patriarcalismo, que é a manifestação do patriarcado em forma de organização social, é um legado dos colonizadores portugueses. A conjunção entre religiosidade e escravidão no Brasil rural que nasce com a colonização da América Portuguesa dá origem ao patriarcalismo brasileiro. O patriarcado no Brasil, que nasce agrário e escravista, se transformou ao longo dos últimos 5 séculos, especialmente com o desenvolvimento do capitalismo e do complexo industrial-urbano. Ao contrário do que se poderia pensar, de que o patriarcado arrefeceria com maior liberdade para as mulheres na vida urbana moderna, na verdade, seus laços de dependência na esfera doméstica aumentaram e foram diversificadas as formas de violência de gênero.
Como o patriarcalismo está presente na sociedade brasileira?
O patriarcalismo se manifesta em múltiplas dimensões na sociedade brasileira, seja na educação, na cultura, no exercício religioso, na política, na mídia, na produção literária, no mercado de trabalho, nas relações domésticas e sociais em geral.
Como o patriarcalismo impactou e impacta a sociedade?
Há um impacto histórico na formação social brasileira, desde a violência contra os povos indígenas e originários, especialmente as mulheres, o longo período de escravidão, o Brasil rural, o Brasil urbano-industrial moderno, na formação do mercado de trabalho, na formação da elite política, na sobrecarga de tarefas sobre as mulheres, em sua exclusão dos espaços políticos de decisão. São multidimensionais os impactos.
Como funciona a sociedade patriarcal?
A sociedade patriarcal funciona a partir do estabelecimento de uma divisão sexual em que cabe aos homens a origem e o destino de todas as decisões. Para tanto é preciso haver subordinação e controle dos corpos das mulheres. É necessária uma apropriação masculina das funções sexuais e reprodutivas das mulheres. Esse tipo de sociedade existiu bem antes do advento do capitalismo, embora o capitalismo tenha se valido do patriarcado para a reprodução do controle da propriedade privada e da exploração econômica.
Como o patriarcado afeta os homens?
O patriarcado coloca uma grande responsabilidade sobre os homens. Eles devem ser os provedores, os solucionadores de conflitos e problemas, os senhores e soldados das guerras, os contendores das insurgências. Neste tipo de sociedade, a cooperação, a solidariedade, a empatia e a construção social conjunta não tem muito espaço e lugar. Para exercerem tais tarefas, os homens, em especial os brancos, heterossexuais e em idade produtiva, precisam oprimir e subordinar o restante da sociedade. São portadores, portanto, da exclusividade do uso da violência que se manifesta na violência de gênero, racial, etária, homofóbica. Para os homens, o preço de estar nesta posição de reprodução da dominação patriarcal é bem alto perante os “benefícios” recebidos.
O que é a violência patriarcal?
A violência provocada por uma concepção patriarcal de sociedade é aquela que busca “restabelecer” ou “reordenar” algum desvio do padrão que tem o homem no centro de tudo. Quando uma mulher sobressai a outros homens de seu meio, torna-se independente, desafia a autoridade ou o senso de propriedade que um ou mais homens têm sobre ela, eles se veem no direito, socialmente legitimado, de defender sua “honra” e serem violentos com aquela mulher. Essa violência pode ser física, psicológica ou moral.
Quem são as vítimas do sistema patriarcalista?
Toda sociedade é vítima de uma sociedade patriarcal. Todos sofrem e de alguma forma reproduzem o padrão, como uma espécie de ciclo vicioso do qual é muito difícil sair. Mas como se trata de um sistema que gera opressão, obviamente as mulheres são as que mais sofrem. Especialmente as mulheres pobres e negras por serem o elo mais frágil da corrente social.
O que já avançamos?
No Brasil, já avançamos bastante na legislação protetora da mulher vítima da violência doméstica, sexual, e vários tipos de assédio. Já se alcançou a ampla inserção das mulheres na educação e no mercado de trabalho, mas ainda falta avançar muito em termos de consciência social sobre esta condição e medidas para superá-la.
Como é o patriarcado hoje?
Nos dias de hoje encontramos diversas formas de manifestação do patriarcado, de formas menos ou mais explícitas. Nas sociedades islâmicas, por exemplo, está mais explícita a divisão de poderes entre homens e mulheres. Nas sociedades cristãs modernas ocidentais o patriarcado tem sido cada vez mais mascarado com a aparência de que as mulheres possuem liberdade para estudar, trabalhar, se relacionar, mas essas máscaras caem quando olhamos para os altíssimos índices de violência sexual, doméstica e feminicídios. Quando olhamos para a composição das principais casas dos poderes políticos estabelecidos.
O que fazer para acabar com o patriarcado?
Alterar a consciência social. E esse processo é longo e cheio de altos e baixos. Ele é complexo pois exige uma combinação de ações, movimentos, lutas sociais, experiências, vivências, conquistas, construção de autocrítica, autopercepção, formação coletiva, ações culturais e educativas, investimento na conscientização das novas gerações, políticas públicas, debates profundos com as diversas religiões. É uma transformação cultural de grande complexidade que tem e sofre impacto de outras estruturas, como a econômica, racial, social, política e religiosa. Nos marcos do capitalismo dificilmente o patriarcado será superado, pois ele foi incorporado como uma de suas molas mestras. São diversas lutas que se conectam para a superação do patriarcado.
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Fonte: BdF Rio Grande do Sul
Edição: Katia Marko