Universidade Federal da Bahia promoverá entre 8 e 10 de fevereiro próximo o Congresso Internacional Santas e Heréticas - gênero, religião e poder. Contatos via
De 8 a 10 de fevereiro de 2023
Na história bimilenar do universo cristão assiste-se às tentativas de modulação dos papeis das mulheres a partir de visões dicotômicas, universalistas e naturalizadas. Percebe-se que os cristianismos criaram ideias de santidade para as mulheres, o feminino e as feminilidades que se opuseram aos estereótipos das mulheres consideradas pecadoras e heréticas. Se, por um lado, exaltou-se a pureza de Maria, por outro, menoscabava-se a vinculação ao pecado original atribuído a Eva, ressaltando a obediência da primeira aos desígnios de Deus perante o que se lia como um desafio da segunda às proibições sagradas. Mas os temas da santidade e heresia, ordem e desordem, normalidade e transgressão precisam ser melhor investigados para além das dicotomias simplistas.
É sobre essa dicotomia, de forte matriz doutrinária e construída por tratadistas, moralistas, canonistas, teólogos(as), pregadores(as) etc., bem como os seus respectivos desdobramentos sobre as condições das mulheres em diferentes sociedades, que o presente Congresso pretende concentrar seus esforços reflexivos. Partindo de duas classificações genéricas e heurísticas (santas e heréticas), propõe-se uma análise que não só valorize os discursos e práticas de e sobre as mulheres, o feminino e as feminilidades, mas também as experiências e representações de homens, do masculino e das masculinidades. Neste caso, sem deixar de lado nosso eixo temático, almeja-se reunir professoras(es) e pesquisadoras(es) que se dediquem a compreender o modo como as santidades e heresias femininas são construídas, legitimadas, mantidas, rejeitadas, resistidas e até negociadas no universo religioso cristão ou não.
Procurar-se-á também refletir como, e por quais motivos, as próprias instituições enquadram ou não as mulheres nas duas categorias, sem deixar de enfatizar outros discursos e experiências de santidade e heresia. Assim, por meio de casos particulares das agências femininas, objetiva-se congregar estudiosas(os) e interessadas(os) em investigar de forma complexa, relativa, plural, dinâmica e relacional tal tema, destacando as interseccionalidades que as diretrizes de gênero possuem com outros marcadores sociais e históricos em mundos pretensamente masculinos. O Congresso, portanto, visa abarcar a pesquisa, o ensino e a extensão acadêmicas. Estarão no centro da sua atenção os papéis, condições, discursos e experiências das mulheres, bem como as modalidades de resistências femininas em matrizes religiosas das sociedades antigas, medievais, modernas e contemporâneas.
MINICURSOS:
Minicurso 1: A Hagiografia e a biografia Devota em Portugal na Época Moderna:
textos e contextos.
Professora Responsável: Paula Almeida Mendes (CITCEM/U.Porto)
Resumo: A literatura hagiográfica, cujas raízes se ancoram nos tempos do cristianismo primitivo, constitui um dos subgéneros da literatura religiosa e de espiritualidade de muito significativo sucesso. Ao longo da Época Moderna, a produção de «Vidas» de santos e de «Vidas» devotas conhecerá, na esteira das críticas de humanistas e de reformados e da ofensiva disciplinadora da Contrarreforma, uma muito significativa amplificação, declinada em múltiplas edições e traduções, que divulgavam altos exemplos de santidade, que, no caso feminino, eram «corporizados» por mártires, virgens, religiosas, penitentes ou leigas (sobretudo rainhas, nobres ou viúvas). Em todo o caso, pese embora o pendor edificante e normativo que enformam estes textos – não raras vezes mesclado com a dimensão do «maravilhoso» -, assim como a preocupação em cristalizar a fama sanctitatis dos biografados, convertendo-os em altos exemplos modelares, algumas destas obras, editadas no período compreendido entre os séculos XVI e XVIII, declinam casos de mulheres sobre as quais pairaram suspeitas de falsa santidade e de heresia. Neste sentido, impõe-se auscultar os moldes em que, nestas «Vidas» polarizadas em torno de figuras femininas que alcançaram, não raras vezes, um significativo destaque na época, se constroem e percecionam as fronteiras entre santidade e heresia.
Minicurso 2: O feminino na vida consagrada: estudo de trajetórias de missionárias no século XX – experiências em contextos africanos e brasileiros.
Professora Responsável: Patrícia Teixeira Santos (UNIFESP; CITCEM/U.Porto)
Resumo: Este curso pretende aprofundar a reflexão da inserção feminina na vida consagrada no século XX. Dar-se á ênfase a experiência das mulheres que participaram das missões em contextos africanos e brasileiros, evidenciando seus protagonismos, desafios e transformações que decorreram de processos onde a condição de gênero teve um papel fundamental na interferência das suas histórias e escolhas.
MINICURSO 3: Igreja católica e Inquisição portuguesa: Estudos de Gêneros e relações de poder.
Professoras Responsáveis: Iara Silva de Jesus- Mestra em História Regional e Local (UNEB) e Joseane Pereira de Souza- Doutoranda em História Social (PPGH-UFBA)
Resumo: No contexto da Reforma católica, a Inquisição Portuguesa foi um dos mecanismos de imposição do catolicismo como religião oficial na metrópole e nas colônias. As terras do Brasil estavam sob a alçada do Tribunal de Lisboa, que formou uma rede de oficiais encarregados de manter o controle da fé e reportar os casos de heresias e atitudes consideradas imorais para Lisboa, já que no Brasil não houve a instalação de um Tribunal. Os Estudos de Gêneros nos permitem entender como as instituições incorporam os gêneros nos seus pressupostos e nas suas organizações sociais determinando papéis aos diversos sujeitos em processos históricos. Nesse sentido utilizaremos documentos produzidos pela Igreja católica e pela Inquisição para analisarmos como essas duas instituições foram produtoras de estereótipos de gêneros. Nessas fontes percebemos as imposições de saberes e costumes europeus, cristãos e patriarcais sobre as práticas que se afastassem deles, determinados como únicos aceitos. Os objetivos do minicurso são: entender os mecanismos de ações do Tribunal da Inquisição portuguesa como aliado do catolicismo na tentativa de manter-se como religião hegemônica; compreender a construção dos mecanismos e dispositivos de gêneros nas relações de poder por meio dessas instituições; e refletir e explorar as possibilidades da utilização das fontes eclesiásticas e inquisitoriais para os Estudos de Gêneros e escrita da História.
MINICURSO 4:
O jogo Hagiografando: trabalhando a categoria Gênero no Ensino de História.
Professores(as) Responsáveis: André Rocha de Oliveira (Doutorando - PPGHC/UFRJ ), Andrea Reis Ferreira Torres (Doutoranda - PPGHC/UFRJ) e Mariane Godoy da Costa Leal Ferreira (Doutoranda - PPGHC/UFRJ)
Resumo: Considerando a relevância da discussão sobre gênero dentro da sala de aula, como meio para combater preconceitos e discriminações, este minicurso tem por objetivo apresentar o jogo Hagiografando. Este jogo foi um dos desdobramentos do projeto “A construção medieval da memória de santos venerados na cidade do Rio de Janeiro: uma análise a partir da categoria gênero”, desenvolvido no âmbito do Programa de Estudos Medievais da UFRJ com o aporte financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), entre os anos de 2015 e 2018. Cabe destacar ainda, que o jogo segue sendo aperfeiçoado, agora no desenrolar do projeto “Os legendários abreviados mendicantes, a temática do martírio e a construção medieval da memória de santos venerados no Rio de Janeiro”, também financiado pela FAPERJ. Valendo-se da categoria gênero, segundo a perspectiva de Joan Scott, Hagiografando evidencia a distinção tanto dos papéis desempenhados quanto dos modelos de conduta de santos e santas, cujos relatos foram registrados em hagiografias do século XIII. Neste sentido, ao propor a criação de narrativas a partir destes elementos, o jogo contribui para a compreensão de que o gênero é uma construção histórico-cultural das relações sociais que se baseia no saber sobre as diferenças sexuais. Com efeito, para abordarmos as potencialidades do Hagiografando optamos por dividir a presente oficina em três partes, a serem trabalhadas cada uma em um dia. Na primeira, apresentaremos os referidos projetos nos quais a proposta está inserida, bem como concentraremo-nos na discussão do conceito de Hagiografia e das possibilidades dos estudos de gênero. Na segunda parte, discorreremos sobre o processo de desenvolvimento do jogo em si, por meio dos elementos que nortearam sua construção. Por fim, a terceira e última parte terá um caráter prático: jogaremos o Hagiografando com o intuito de testá-lo como uma ferramenta didática útil à apreensão, tanto das questões de gênero, quanto daquelas concernentes à santidade medieval.
08/02 a 10/02
Campus de Ondina e Campus São Lázaro - UFBA - Salvador
Local: Campus de Ondina e Campus São Lázaro - Universidade Federal da Bahia, Salvador – Bahia; PAF1 (Ondina)
Período: De 8 a 10 de fevereiro de 2023
Público-alvo: Professores dos ensinos fundamental, médio e superior, pesquisadores, estudantes da graduação e pós-graduação, egressos.
Contato: santasehereticas@
fonte: http://www.santashereticas.ufba.br/