As eleições para a composição das mesas diretoras das Casas Legislativas nacionais, ocorridas dia 02 de fevereiro, confirmam a distância das correlações de força da cúpula do Parlamento com as questões afetas à representatividade proporcional do "povo brasileiro". O processo de negociação das candidaturas passou longe da discussão de uma agenda visando interesses públicos.
A cobiça de grandes partidos na ocupação dos espaços de poder dentro do Parlamento foi bem noticiada pela mídia e verificada pelos movimentos de mulheres nos seus resultados: a manutenção do modelo de líderes conservadores e uma estrutura de maioria masculina - todos os cargos da Câmara foram ocupados por parlamentares homens e, apenas no Senado Federal constam duas mulheres participando da Mesa Diretora.
Aqui não tratamos de segmento que requer destaque por privilégio. O alerta e a necessidade de atenção para pautas feministas e das organizações de mulheres são subsidiadas no reconhecimento de que se trata de mais da metade da população, que historicamente é alvo de desigualdade estruturante na formação pública da sociedade e, que suporta diversas e graves discriminações sistemáticas. Nas eleições referidas a participação feminina esteve desconectada, exceto pela novíssima definição das senadoras Serys e Patrícia Saboya na Mesa do Senado. Na Câmara, ao final dos discursos e da posse, apontou-se para a presença, como ouvintes, nas reuniões do Colégio de Líderes e a criação de uma estrutura nova para servir à representação feminina - chamada Procuradoria Parlamentar da Mulher.
É de efetivas prioridades de interesse público e social que aqui nos referimos. Queremos firmar um tempo em que as discussões de apoio e alianças nos espaços de poder sejam realizadas com participação e articulação da diversidade de composição da sociedade. As pautas políticas e deliberativas nos espaços decisórios não podem prescindir da garantia de representatividade dos principais elementos de formação de uma sociedade. A proporcionalidade partidária que é constitucionalmente assegurada e regimentalmente conferida em nome do pluralismo político - formador da nossa República - precisa se firmar em bases verdadeiramente democráticas. Isto somente alcançaremos com a disposição de igualdade de oportunidade e respeito entre gêneros.
Se a eleição da Mesa Diretora se constituir num processo avesso à vontade e composição social, principalmente das mulheres, contamina a convivência democrática nos espaços do Poder Legislativo. Essa prática política é incoerente com o seu caráter público e pode levar à insegurança e descrença no compromisso do Parlamento com legítimos interesses sociais.
Para o biênio 2009-2010, muitas demandas sensíveis a segmentos da população estarão expostas e em risco. No caso das mulheres, algumas questões específicas exigem uma presença firme, a voz altiva e a força política para o enfrentamento.
A exemplo da iminência da instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara para investigar a prática clandestina de aborto no Brasil.Esse assunto é marcado pelo senso comum e por contradições na vida real e urge que seja enfrentado e debatido com seriedade e responsabilidade, típicas de um Estado Laico, sem religiosidade que fundamente decisões dos Poderes. Um tempo de nova Inquisição, onde mulheres podem ser expostas em praça pública é incompatível com qualquer compromisso do Parlamento brasileiro frente a reais demandas da sociedade.
Mais uma vez firmamos a posição de que pretendemos um Congresso Nacional que colabore para mudar a história de desigualdade e restrição das mulheres na esfera pública. A manutenção da exclusão das mulheres dos espaços de poder e as posturas conservadoras e sectárias em relação aos temas de interesse público não consolidam práticas republicanas democráticas e legítimas. Estamos alertas e dispostas a fazer diferença!