Antonio Carlos Egypto (
Psicólogo e educador, membro fundador do GTPOS e membro da equipe de elaboração dos PCNs de 5a. a 8a. séries. Co-autor de diversos livros e publicações.
Orientação Sexual na escola supõe um trabalho contínuo, sistemático e regular e que acontece ao longo de toda a seriação escolar. Deve começar na educação infantil e se estender até o final do ensino médio. Na verdade, precisaria existir também na universidade, mas esta já é uma outra história.
Pressupõe a capacitação e o acompanhamento, na forma de supervisão do trabalho, dos educadores que se responsabilizarem pela tarefa. E espera-se que ultrapasse os limites da sala-de-aula para se tornar objeto de reflexão e debate na comunidade escolar. Pode envolver todas as áreas de ensino, orientadores, coordenadores, auxiliares de ensino, tutores e os pais e mães dos alunos.
Não é raro que isto aconteça porque, ao mesmo tempo em que o processo de implementação de orientação sexual na escola representa um desafio que assusta muitas escolas e educadores ainda hoje, ele também envolve e apaixona muitos outros.
Quando a escola assume o projeto e o inclui na sua proposta pedagógica, a responsabilidade passa a ser de todos e não apenas de uma pequena equipe que se dedica ao tema. E aí é possível obter o apoio necessário da direção e do corpo docente para que a escola fale a mesma linguagem e compartilhe de uma visão comum sobre a sexualidade humana. Afinal, trabalhar o corpo erótico e reprodutivo visando ao legítimo direito ao prazer, à busca de relações de gênero com eqüidade e à prevenção das doenças sexualmente transmissíveis/Aids, tem que ser propostas da escola como um todo, não de um ou outro professor mais iluminado.
Estes três eixos - corpo, gênero e DST/Aids - são os norteadores de todas as abordagens da sexualidade na escola. Os temas que serão tratados variam bastante e atendem à demanda dos alunos. São escolhidos por eles, os menores manifestando em ações, desenhos, histórias, perguntas. Os maiores explicitando os temas que mais os preocupam e causam polêmica. Vamos tratando desde de onde viemos e como nascem os bebês à contracepção, aborto, homossexualidade, abuso sexual, sadomasoquismo. Depende deles e do que estiver rolando na sociedade e na mídia.
Na educação infantil e ensino fundamental até a 4a. série, o professor deve estar muito bem preparado não só para perceber como para atuar com as crianças, sempre que a questão se colocar. E ela se coloca, inevitavelmente. É só aprender a ver, deixar de se defender do assunto.
Para atender às necessidades dos adolescentes, a partir da 5a. série, quando a escola trabalha com um professor para cada matéria, torna-se indispensável criar um espaço específico no currículo escolar para trabalhar a sexualidade.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) incorporam esta idéia e incluem também a Orientação Sexual como tema transversal, a ser trabalhado por todas as áreas de ensino.
Minha experiência no GTPOS - Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientação Sexual - e com escolas particulares e públicas de São Paulo, onde atuo desde meados dos anos 70 com Orientação Sexual, mostra que este não é um desafio fácil de enfrentar.
O tema da sexualidade mexe muito com as pessoas, desestabiliza alguns, provoca resistências. Quem se dedica ao trabalho e vê o quanto ele interessa e mobiliza os alunos, se encanta e se apaixona. Aliás, os alunos também se apaixonam. Mas envolver toda a comunidade escolar já é uma tarefa mais complexa e que pressupõe um processo longo e cuidadoso para não queimar etapas nem produzir fortes resistências. A orientação sexual na escola não se confunde com as fórmulas fáceis de palestras eventuais, "sacadas" sensacionais ou remédios milagrosos que em pouco tempo resolvem tudo. Ela é um processo artesanal e elaborado, onde se constrói conhecimento, cidadania e mudança social. Não é um modismo passageiro, tão comum nestes tempos globalizados e consumistas. A orientação sexual veio para se incorporar de forma definitiva à escola. Além de ser um tema social urgente, a sexualidade é central na vida das pessoas e sua discussão especialmente relevante para crianças e adolescentes.