A demora para aprovar projetos sobre o atendimento às vítimas de violência durante a Pandemia é responsabilidade da bancada fundamentalista. Só no último dia 7 de julho, quase quatro meses depois da interrupção de vários serviços e instituição do trabalho remoto por causa da necessidade do isolamento social, foi sancionado o primeiro projeto que trata do funcionamento de equipamentos e serviços de enfrentamento à violência contra as mulheres, como casas abrigos, delegacias especializadas e outros. O PL 1291/2020, apresentado por 32 deputadas, agora é a Lei 14.022/2020.
Essa lentidão tem a ver com a falta de prioridade do tema no Congresso – a baixa representação feminina contribui muito para isso – e a ação de um grupo de parlamentares que, desonestamente, tenta confundir a rede de atendimento às mulheres que sofrem violência com a justa demanda pela legalização do aborto.
Os projetos de enfrentamento à violência contra as mulheres são a nova trincheira antiaborto no Congresso.
A maior parte das propostas apresentadas pelas deputadas reforça o direito das mulheres que sofrem estupro ou outras violências sexuais de serem atendidas diretamente nos serviços de saúde. Mas agora, qualquer trecho que trate de “direitos sexuais e reprodutivos” ou “saúde sexual e reprodutiva” é duramente atacada, sob o argumento que o objetivo é a legalização do aborto. A deputada Chris Tonietto (PSL/RJ) se refere as essas propostas como “pacotão do abortoduto” ou “covidão do aborto". Na publicação feita em suas redes, ela afirma: “diversos Projetos de Lei elaborados, principalmente, por componentes da bancada feminista para implementar, por vias indiretas, o aborto no Brasil, quer por meio da atuação de ONGs, dos Centros de Atendimento Integral ou dos serviços de "saúde sexual e reprodutiva".
Vale lembrar que as mulheres sofrem abortos indesejados e que, como sabemos, o direito à interrupção da gravidez no Brasil é extremamente restrito, sendo autorizado somente nos casos em que a mulher corra risco de morte, em que a gravidez seja resultante de um estupro ou quando o feto tem anencefalia; e, pelas normas técnicas do Ministério da Saúde, a mulher pode procurar o serviço de saúde primeiro. Há uma série de questões que motivam esse direito, dentre elas o fato de que estupros acontecem muitas vezes dentro de casa, as vítimas são jovens e não querem ou não sabem como procurar ajuda. Mesmo assim, não são todos os hospitais que oferecem esse tipo de serviço. Na maior parte dos estados, os serviços estão disponíveis somente nas capitais e em hospitais considerados de referência.
Fundamentalistas espalham mentiras (FakeNews) e impedem o avanço de projetos de enfrentamento à violência contra as mulheres durante a Pandemia alegando serem projetos que visam a legalização do aborto no Brasil.
A má-fé e a crueldade do grupo de parlamentares fundamentalistas no Congresso é dizer que esse direito é uma tentativa de legalizar o aborto integralmente no Brasil. Tanto o projeto recém sancionado (PL 1291/2020) como o PL 1444/2020, que está agora em discussão, não entrou na lista de projetos para votação no Plenário porque alguns deputados querem incorporar uma emenda ao projeto impedindo que os recursos sejam usados para a realização de abortos. E na lógica no funcionamento remoto, sem acordo não tem votação. Hoje, a bancada fundamentalista é maior do que a feminista e para construir palanques e continuarem mobilizando seu discurso de ódio, pró-morte e misógino, colocam em risco o enfrentamento à violência contra as mulheres de forma geral.
A rede de atendimento às mulheres vítimas de violência vem sofrendo com o desmonte, com a falta de investimentos, de capacitação de profissionais, dentre outras questões. E a situação só piora a cada dia, pois o isolamento social amplifica os conflitos familiares, e as mulheres ficam ainda mais desprotegidas. Os Projetos de Lei não têm força de política pública, não resolvem os problemas que estamos enfrentamento na rede, mas pelo menos uniformizam a compreensão sobre o atendimento e os mecanismos que podem ser usados no enfrentamento da violência contra as mulheres. Mas parlamentares fundamentalistas preferem se concentrar em produzir mentiras, confundindo o direito ao atendimento de mulheres vítimas de violência, que necessariamente inclui o aborto para casos de gravidez resultante de estupro (assegurado no Código Penal, por sinal, desde 1940), com a legalização do aborto no Brasil. É desonestidade e desinformação juntas.
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