No dia 1º de outubro, o ministro do Trabalho e Emprego, Francisco Dorneles, visitou o Presidente do Congresso Nacional, senador Ramez Tebet (PMDB/MS) pedindo apoio ao Projeto de Lei que o Presidente Fernando Henrique Cardoso enviará, ao Legislativo, modificando o artigo 681 da CLT. A proposta estabelece que as condições de trabalho acertadas entre patrões e empregad@s prevalecem sobre o que está determinado na legislação. Esta nova regra valerá para qualquer situação, desde que não contrarie os direitos trabalhistas previstos na Constituição.
No dia 3 de outubro, a proposta do governo chegou à Câmara dos Deputados e está tramitando sob o Nº 5.483/01. O governo acena com a possibilidade de requerer o regime de urgência constitucional para sua tramitação, o que lhe conferirá prioridade de apreciação e votação dentro do Congresso Nacional. Caso isto ocorra, o projeto terá 45 dias para tramitar na Câmara e o mesmo prazo para apreciação no Senado Federal.
Esta proposta faz parte de uma discussão iniciada pelo próprio Ministério do Trabalho e Emprego, no ano passado, sobre a necessidade de se promover uma reforma trabalhista que desse maior flexibilidade às regras de funcionamento do mercado de trabalho no Brasil, permitindo uma diminuição dos custos do trabalho para o empregador. A medida aumentaria a competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional.
Para isso, o ministro Dorneles propunha uma alteração do artigo 7º da Constituição Federal, permitindo que os acordos e convenções coletivas preva-lecessem sobre os direitos dos trabalhadoras e trabalhadores rurais e urbanos, previstos naquele artigo. Como houve um "grita geral", por parte dos sindicatos e centrais sindicais, o Ministério optou por uma nova estratégia que se consolidou nessa proposta de modificar a CLT.
Assim, os direitos constitucionais permanecem intocáveis, mas a sua regulamentação, que é feita pela CLT, poderá ser negociada. As reações à ela têm sido diferentes. Há Centrais que não aceitam o conteúdo proposto, há outras que se alinham com o governo e acreditam que esta é mais uma oportunidade de reforçar o poder de negociação dos sindicatos.
No caso da licença gestante, por exemplo, a Constituição é bem clara ao prever o período e o pagamento integral do salário, sem prejuízo do emprego. Porém, salário não é remuneração. Poderá haver negociação de itens que compõem a remuneração da trabalhadora, como é o caso do auxílio alimentação. O direito à férias remuneradas está assegurado na Constituição, mas é a CLT que detalha as regras. Patrões e empregad@s poderão negociar a divisão dos 30 dias e a forma de pagamento. Outro exemplo, a redução de salários: o texto constitucional prevê "a irredutibilidade dos salários, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo". Até o momento, são raros os acordos que tratam desse tipo de cláusula, mas caso seja aprovada a alteração da CLT esse tipo de negociação pode ganhar força.
A proposta vulnerabiliza ainda mais a situação dos trabalhadores e das traba-lhadoras. As taxas de desemprego entre as mulheres vêm crescendo mais do que entre os homens. Essa maior vulnerabilidade das mulheres faz com que os impactos dessa mudança na CLT atinjam as trabalhadoras de maneira mais grave do que os homens.
As diferenças de opinião não ficam restritas às centrais sindicais. Especialistas e técnicos também questionam o alcance das medidas previstas no projeto e se elas realmente não irão significar retirada de direitos constitucionalmente garantidos. Uma questão parece surgir nesse contexto em que o país se encontra: qual a força que os sindicatos e as centrais sindicais terão para negociar seus direitos num clima de recessão e desemprego crescentes? Em nome da garantia do emprego, quantos direitos serão negociados? O que acontecerá com a inevitável transferência de rendas do trabalhador para os patrões face à negociação de direitos? Estes recursos se reverterão para investimentos na produção, na ampliação de empregos, ou serão aplicados na ciranda financeira, onde a lucratividade é maior?
Enfim, a discussão sobre o tema está apenas começando. Precisamos acompanhar o desenrolar dos acontecimentos para formarmos uma opinião mais sólida sobre este projeto de lei. Caso o governo peça urgência o parlamento não terá tempo hábil para aprofundar as discussões sobre o tema. A mobilização dos trabalhadores e das trabalhadoras brasileiras será fundamental para que direitos não sejam perdidos em nome de um pretenso fortalecimento do movimento sindical.