Quase lá: Saúde da mulher no município: os desafios de fazer o SUS

Ligia Mendonça
Socióloga sanitarista e feminista, com especialização em epidemiologia, foi secretária municipal de saúde em União da Vitória-PR, entre julho de 99 e dezembro de 2000.

O município fica no sul do Paraná, às margens do Iguaçu. Com 48 mil habitantes, a cidade tem dois hospitais gerais filantrópicos e um hospital psiquiátrico conveniados ao SUS. O Consórcio Intermunicipal gerencia o Ambulatório de Especialidades e o Hemocentro.

A rede municipal tem 10 pequenos postos de saúde na área rural, 12 na área urbana e um Pronto Atendimento Emergencial. Assumi a Secretaria Municipal de Saúde com o objetivo de efetivar o SUS, mudando a forma de atendimento. A prefeitura já investia em saúde quase 10% da receita própria e desejava melhores resultados.

O atendimento às mulheres acontecia de forma tradicional, centrado na consulta médica. Das 3 enfermeiras, apenas uma fazia atividades dirigidas às mulheres, coordenando 13 agentes comunitários de saúde, o programa de “ preventivo do câncer “ e o planejamento familiar. Nenhuma entidade de mulheres participava no Conselho Municipal de Saúde.

O principal problema sentido pelas mulheres estava no atendimento hospitalar: os partos pelo SUS eram geralmente feitos por parteiras leigas e o médico só vinha “se complicasse”. O hospital reclamava dos baixos valores pagos pelo Ministério da Saúde e os obstetras propunham que os plantões fossem remunerados.

Resolvemos assumir o pagamento dos plantões quando ocorreu o segundo caso grave de lesão de bebê no parto (dez.99), mesmo entendendo que não era obrigação do município, em gestão plena de atenção básica. Foi encaminhado projeto à Câmara que autorizou o convênio com a maternidade. Durante o ano foram pagos 365 plantões noturnos aos obstetras (120 reais por plantão) e as reclamações diminuíram, confirmando o acerto da decisão.

Outras realizações importantes para as mulheres:

  • contratação, por concurso, de 6 equipes completas do Programa de Saúde da Família -PSF, com reuniões e atividades constantes de formação e atualização para garantir qualidade;
  • aumento das visitas domiciliares, com busca ativa de pacientes de risco;
  • descentralização de várias ações para os postos urbanos com PSF: exame ginecológico e coleta de preventivo do câncer; orientação e entrega de métodos anticoncepcionais; grupos de gestantes e puérperas ;teste de gravidez e vacinas; medicação básica e material didático;
  • aumento de 15 para 40 ecografias mensais para gestantes, e de 4 para 15 mamografias;
  • implantação do protocolo de Pré-natal de baixo risco e prontuário da gestante;
  • acesso de todas as gestantes aos dentistas;
  • coleta anual de preventivo nas comunidades rurais,com apoio da Emater;
  • implantação da comissão para triagem dos pedidos de vasectomia e laqueadura pelo SUS;
  • realização da semana MAIO MULHER em 99 e 2000, com discussões e palestras ,e atividade dirigida para as servidoras públicas; e
  • estímulo para o ”olhar de gênero” sobre as estatísticas de doenças e mortes.

A análise da AIDS no município comprovou que a contaminação é crescente e mais acentuada entre as mulheres: em 2000 foram 12 novos casos de HIV+ , sendo 8 em mulheres!

Temos certeza de que os serviços básicos de saúde para as mulheres melhoraram, mas a continuidade dependerá da atual administração e da capacidade das mulheres participarem e fiscalizarem. Essencial também que sejam aumentados os valores da tabela SUS e que os níveis estadual e federal do SUS viabilizem o acesso a serviços de maior complexidade, como ecografias, mamografias e cirurgias ginecológicas.


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