Quase lá: Controle social, mulheres e cidadania

Eliana Magalhães Graça
Socióloga e assessora parlamentar do CFEMEA

No último dia 15 de junho participei, em Belo Horizonte, do I Congresso Brasileiro de Controle Social do Orçamento Público, promovido pela Prefeitura de Belo Horizonte, Assembléia Legislativa de Minas Gerais e Fórum Nacional de Participação Popular.

Ficou claro que o movimento social no Brasil hoje tem encontrado várias formas de exercer sua cidadania controlando de forma sistemática as ações de seus governantes. Uma das formas mais freqüentes de exercer esse direito tem sido através do acompanhamento e controle dos orçamentos públicos nos diferentes níveis de governo.

Foi um momento de reflexão bastante enriquecedor, pois o espectro das discussões variou desde a análise de experiências concretas de controle social em suas mais diversas formas até a questão da reforma tributária e de temas políticos como participação popular, democracia e cidadania.

Foram ressaltadas as diversas experiências do orçamento participativo como uma das formas mais desenvolvidas de controle social. Mereceu destaque também o papel importante que joga o poder legislativo nas diversas formas de controle social. Evidenciou-se a importância da participação popular na gestão da coisa pública, entendida não como uma técnica de administração, mas como uma forma de compartilhamento do poder.

Em tempos de pensamento único, quando os governantes tentam justificar todo e qualquer sacrifício em prol do desenvolvimento do país, ou da chegada do Brasil ao primeiro mundo, ou como reflexos da globalização, falar em participação popular, em controle social, em exercício da cidadania leva à construção de um futuro diferente daquele que o pensamento único quer impor à nossa sociedade.

As experiências relatadas e analisadas durante o Congresso nos remetem a pensar em novas formas de vitalização das relações entre sociedade e governo, do espaço público e da representação social e política, que podem desafiar a apatia social. Ao mesmo tempo em que têm renovado os atores sociais, aquelas experiências se constituem numa resistência aos destinos pré-traçados pelos arautos do neoliberalismo, no sentido de melhorar carências e de aperfeiçoar a democracia.

O grande avanço acontecido em experiências de controle social se verifica principalmente no nível dos municípios. Em alguns estados o processo está apenas iniciando. A participação popular tem se dado não só na definição do quanto e do com que gastar o recurso público, mas também no acompanhamento das ações de execução.

O interesse específico do CFEMEA em participar de um fórum da natureza desse Congresso se deve a uma decisão política interna do Centro de estender sua atuação para área de acompanhamento, controle e fiscalização do Orçamento da União nas questões que dizem respeito aos interesses das mulheres. Essa decisão parte da constatação de que em muito já avançamos nas questões de conquistas refletidas nas várias legislações aprovadas garantindo direitos importantes para as mulheres. Porém, existe uma defasagem entre essa legislação e a concretização das políticas públicas que, via de regra, não executam o previsto na legislação.

O caso mais evidente, para citar apenas um exemplo, é a lei que criou o direito de todos ao planejamento familiar. Em vigor desde 1997, não encontramos respaldo nas ações desenvolvidas pelo Estado brasileiro junto à população que dêem aos cidadãos acesso efetivo a esse direito duramente conquistado.

No caso dos municípios e dos estados o controle pode se dar de forma mais direta pela população, ou seus delegados, pois o próprio Poder Executivo tem se disposto a compartilhar com a população a decisão sobre os gastos. Inclusive promovendo a capacitação dos interessados para que exerçam de forma competente seus direitos.

A questão se complexifica bastante se pensarmos no Orçamento da União. O Executivo Federal se recusa a compartilhar com a sociedade o poder de decidir como, onde e quanto gastar. Como sabemos, existem alguns fóruns de controle e participação social, como é o caso dos Conselhos, que atuam no nível nacional, a exemplo do CONFAT, CNS, dentre outros. Porém, mais recentemente, esses fóruns têm sido esvaziados, ou por falta de mobilização dos setores interessados ou por política deliberada do próprio governo federal, que busca a descaracterização de suas funções.

Para nós, tem ficado claro a importância que ganha o Poder Legislativo Federal no controle dos gastos públicos, como canal efetivo de participação, como possibilidade de garantia da democratização do orçamento da União.

Além disso, verifica-se uma falta de articulação e de preparo maior da sociedade civil organizada para exercer o seu poder de pressão para que o Legislativo cumpra suas funções constitucionais que ultrapassam o poder de elaboração de leis, no sentido estrito, se estendendo ao controle e à fiscalização dos atos do Poder Executivo.

Temos a certeza de que precisamos nos preparar para exercer mais essa tarefa de assessorar o movimento de mulheres na pressão junto ao Congresso Nacional nas questões de aplicação efetiva dos direitos conquistados.


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