A Constituição de 88 representou um marco no país, tanto pelos avanços alcançados na área social, como pela mobilização e participação da sociedade em todo o processo Constituinte. Desfrutando da democracia recém conquistada, a sociedade organizada se articulou, debateu, formulou, mobilizou e participou, efetivamente, em todos os momentos, até a promulgação de nossa Carta Magna. Percorrendo, incansavelmente, os corredores do Congresso Nacional, brasileiras e brasileiros exigiram de cada parlamentar a defesa de suas propostas.
De lá para cá, nossa Constituição cidadã tem sofrido muitas tentativas de reformas, ameaçando os avanços a duras penas alcançados. Sob a alegação de que ela torna o país ingovernável, muitos têm sido os remendos praticados. Apesar de tudo, ainda temos, hoje, com a Previdência Social inserida no capítulo da Seguridade Social, o maior Sistema de Seguro Social da América Latina. Desde 93, no entanto, as tentativas de Reforma vêm pondo em risco esta posição, podendo nos levar a engrossar as fileiras dos países vizinhos, cujos sistemas previdenciários não conseguem suprir as necessidades dos seus cidadãos.
Os efeitos da globalização sobre o mercado de trabalho e a política neoliberal que predominou no país, nos últimos anos, trouxeram para o debate da Previdência uma preocupação estritamente econômica. Fala-se muito em déficit financeiro e pouco no déficit social. Mesmo o novo Governo, eleito com o compromisso de mudança e de reduzir as desigualdades sociais, que tristemente nos caracterizam, talvez não consiga implementar a Reforma desejada, acabando por se render aos múltiplos interesses em jogo e promovendo uma Reforma que irá descaracterizar, ainda mais, a Previdência como instrumento de inclusão social e distribuição da riqueza.
A sociedade brasileira encontra-se, portanto, em uma encruzilhada e existem dois caminhos a seguir, sendo que cada um deles pode nos levar a resultados diametralmente opostos. Ou aproveitamos a Reforma, estendendo os benefícios previdenciários a um número maior de cidadãs e cidadãos, visando a construção de uma sociedade mais justa, ou nos limitamos a olhar a Previdência apenas pelo aspecto econômico, nos deixando iludir com o pretenso déficit e, em pouco tempo, teremos aumentado a pobreza e aprofundado a desigualdade já existente.
A proposta de Reforma está colocada e o Governo se apressa em efetivá-la. A hora é agora e a oportunidade é esta. O Presidente enviou uma proposta para ser discutida pelo Congresso Nacional e a sociedade, mais uma vez, precisa se colocar e agir rápido para ver concretizadas as transformações sociais tão almejadas.
Pensando nisto é que nós do CFEMEA estamos fazendo um esforço no sentido de articular alguns grupos e ampliar o debate em torno da Reforma da Previdência. Como este é um tema pouco aprofundado no âmbito do movimento de mulheres, acreditamos na necessidade de desenvolver um esforço maior de capacitação, neste momento, subsidiando os movimentos de mulheres para participarem dessa discussão de forma mais qualificada. Além dos artigos incluídos no site do Centro, da reunião realizada com especialistas e do grupo de debates criado na internet, estamos editando este Fêmea Especial. Acreditamos que os artigos e matérias aqui publicados servirão de base para a discussão de gênero na Reforma da Previdência, facilitando a participação neste novo momento da história. O desejo é que, exercendo ativamente a nossa cidadania, voltemos a circular pelos corredores do Congresso Nacional, levando as contribuições das mulheres para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.
Esta edição especial do Jornal Fêmea foi produzida pelo Grupo de Trabalho "Reforma da Previdência", composto por Eliana Graça, Guacira Cesar, Iéri Luna, Malô Simões e Michelle Lopes.