Em sua última ronda, o carro falou sobre o Estatuto do Nascituro, que visa garantir direitos civis ao embrião/feto desde a concepção
Nesta quarta-feira (14), o “carro do óvulo”, uma iniciativa da Frente Pela Legalização do Aborto do Rio Grande do Sul (FREPLA-RS), percorreu as ruas do centro de Porto Alegre com informações sobre aborto legal e seguro, direitos sexuais e reprodutivos. A ideia da paródia ao tradicional “carro do ovo” surgiu no início de 2021, em meio à pandemia, como uma forma criativa de atingir o público fora da internet sem quebrar as restrições impostas pelo período. “As pessoas em situação de violência de gênero ficaram enclausuradas nos seus domicílios, inclusive com as pessoas agressoras. Então tentamos sair das redes e fazer um método que a gente conseguisse acessar as pessoas nas suas casas mesmo”, explica Dominique Goulart, advogada, integrante da FREPLA-RS, sócia da Themis – Gênero, Justiça e Direitos Humanos e integrante do Fórum do Aborto Legal do Rio Grande do Sul.
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Para a FREPLA-RS, a clandestinização e a criminalização do aborto causam desinformação, fazendo com que muitas pessoas não saibam que há situações em que a lei permite o aborto legal. “Os casos são realizáveis em hospitais do SUS, de forma administrativa, sem necessidade de qualquer pedido judicial”, relata Dominique.
Desta vez, além das informações sobre aborto, a mensagem do carro se voltou ao Estatuto do Nascituro (PL 478/07), um projeto de lei que visa garantir direitos civis ao feto desde a concepção proibindo o aborto mesmo em casos de violência sexual e que tramita desde 2007 na Câmara dos Deputados. A proposta iria a votação no Congresso também no dia 14, mas, por conta da obstrução de PT, PSOL, PSB e PCdoB, deverá ter mais uma sessão de discussão na Comissão dos Direitos da Mulher. “Isso dá direitos às pessoas que estupraram, os estupradores, direitos inclusive para processar a mulher em caso de tentativa de interrupção de gestação. Isso é algo muito grave. A gente tem uma realidade onde muitas meninas, muitas crianças e adolescentes, são vítimas de violência sexual, meninas grávidas que parem outras crianças. Diversas circunstâncias vão ser barradas por dar um status jurídico ao nascituro, sobrepondo aos direitos da pessoa gestante”, explica.
Em junho deste ano, uma criança de 11 anos vítima de violência sexual que resultou em uma gravidez teve a realização de um aborto legal negada ao procurar um hospital de Santa Catarina. A responsável precisou entrar na Justiça e a criança ainda assim teve seu direito negado novamente pela juíza Joana Ribeiro Zimmer. Após o caso ser exposto, o procedimento foi realizado no Hospital Universitário (HU) Polydoro Ernani de São Thiago, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
No alto-falante, o “carro do óvulo” ecoava:
“Alô mulheres, o carro do óvulo está passando na sua rua. Nós, da frente pela legalização do aborto do Rio Grande do Sul, desejamos longa vidas às mulheres e feministas deste país. Você conhece o Estatuto do Nascituro, também conhecido como estatuto do estuprador? É um projeto de lei que torna ainda mais difícil a interrupção da gravidez prevista em lei desde 1940, como em casos de estupro, risco de vida da gestante ou nos casos de fetos anencéfalos, como decidiu o STF em 2012. E se esse Estatuto do Estuprador for aprovado uma menina vítima de estupro será obrigada a ser mãe, mesmo correndo risco de vida, mesmo que isso represente maiores chances de transtornos mentais e tentativas de suicídio.”
“Alô mulheres, o carro do óvulo está passando na sua rua. No Brasil, a cada 30 minutos uma menina é obrigada a gestar, o aborto seguro e pelo SUS está garantido por lei nesses casos, mas querem nos tirar esse direito. Fique atenta a quem quer tirar os nossos direitos, criança não é mãe, gravidez forçada é tortura. O aborto inseguro coloca em risco a vida de meninas e mulheres, principalmente as de baixa renda. Mulheres negras e indígenas são as mais atingidas. De acordo com o projeto de lei as mulheres grávidas passam a ser consideradas como um criminosas em potencial. Se uma mulher sofrer um abortamento espontâneo em uma situação extrema pode ser alvo de uma investigação policial ou ser processada por ter violado direito a vida do embrião, um embrião não pode ser mais importante do que uma menina ou uma mulher. Estatuto do Nascituro, não!”
“Alô mulheres, o carro do óvulo está passando na sua rua. Diga não ao Estatuto do Estuprador! Mulheres e pessoas que podem gestar terão ainda mais dificuldade de acessar métodos de reprodução assistida. Fale com as vizinhas, amigas, pressione sua deputada, poste nas redes sociais com a #NãoAoEstatutoDoNascituro. Apoie os coletivos e organizações feministas nessa luta. Estatuto do Nascituro, não! Aborto legal, sim!”
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