Quase lá: Programa Institucional 2019-2022

PROGRAMA INSTITUCIONAL 2019-2022

Mulheres em movimento por autonomia e igualdade: formação política, cuidado entre ativistas e incidência-resistência feminista

cfemea33anos

 

 

 

 

Para início de conversa

Em nosso Programa Institucional anterior (2015-2017) destacaram-se como linhas fundamentais de nossa ação a formação na ação política e a dimensão política do autocuidado e do cuidado entre mulheres, como nos expressamos à época: "O trabalho combinado das duas linhas de ação (formação e cuidado entre ativistas), permitirá ao CFEMEA avançar na sua estratégia central de fortalecer a sustentabilidade do ativismo. Laboratórios, experimentações e processos sistemáticos de formação política são indispensáveis, fundamentais para avançarmos estrategicamente." O país estava vivendo o processo de uma crise fabricada por forças de extrema-direita de nítida matriz neo-fascista, o que, já antevíamos, iria impactar a vida das mulheres e ameaçar a democracia.

video botaoBases de nossa política ... 

"Por isso, o atual Programa Institucional dessa organização feminista, que ultrapassa a marca de 30 anos de existência e luta, dialoga com a conjuntura de crise política, institucional e social, reconhecendo o papel de resistência do feminismo na luta política nacional e internacional. "Avaliamos que o Brasil está imerso numa crise profunda. As últimas eleições não deixaram margem de dúvida sobre a força do fascismo na sociedade e no sistema político. O Brasil é parte de um cenário regional e internacional onde o contra-ataque conservador tem se realinhado ao ultraneoliberalismo para barrar as mudanças radicais produzidas no campo da sexualidade, dos direitos humanos, dos direitos civis da população negra, das mulheres e LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e intersexo) ocorridas no século XX. E para desmontar estados nações – via Golpes políticos - para impor lucro sem fim sobre vidas humanas, dizimando populações que vivem em territórios de disputa de mega projetos de “desenvolvimento”, para exploração de mineradoras, territórios também para expansão agropecuária e de monoculturas que ainda prevalecem como modelos econômicos que vão na contramão de modelos sustentáveis, que causam impactos severos ao meio ambiente e às populações locais, verdadeiras guardiãs da natureza e dos direitos de suas comunidades."

A luta continua: desafios a enfrentar

Nosso Sonho

Uma sociedade onde as mulheres sejam respeitadas como sujeitos em sua integralidade, com seus direitos humanos garantidos e sua autonomia afirmada. Que sejam reconhecidas em sua capacidade de propor alternativas – pautadas em princípios de liberdade, justiça, reparação, autonomia, solidariedade, cuidado, bem viver – para uma sociedade livre da exploração do nosso corpo, do trabalho e dos bens comuns, livre das opressões patriarcais, racistas e capitalistas e de todas as formas de desigualdade e preconceito.

video botao Nosso sonho ... 

Nossa Missão

Contribuir para amplificar vozes dos movimentos feministas no Brasil e na América Latina na luta por direitos e na construção de um projeto de sociedade libertária, justa, com igualdade de direitos, não hierárquica, livre de opressões, com respeito aos bens comuns e na promoção de diálogos interculturais.

video botao Nossa proposta ...

Nossa estratégia

Contribuir para a sustentabilidade do ativismo feminista antirracista no Brasil e na América Latina, fortalecendo as lutas e a ação política dos movimentos de mulheres por meio de processos contínuos de formação política; da promoção do autocuidado e cuidado entre ativistas; de ações de incidência e resistência frente à contraofensiva conservadora; do estímulo à produção coletiva de conhecimento, promovendo a comunicação e articulação entre sujeitos e organizações feministas.

video botaoFortalecer a luta feminista ...

 1. APRESENTAÇÃO

Estamos em um momento político que exige redirecionamentos e novas estratégias de ação para enfrentarmos as forças políticas que estão destruindo a ainda frágil democracia que vínhamos construindo. Nesse contexto político, no perguntamos nos últimos anos qual o lugar de uma instituição de 30 anos que construiu sua trajetória na afirmação e construção de direitos para as mulheres brasileiras e latinas? O que uma organização que apostou no diálogo com os poderes públicos pode fazer num contexto antagônico às nossas lutas por democracia e direitos? Como operar a mudança da aposta na institucionalidade como lugar de disputa de um projeto feminista igualitário? Como o feminismo – antissistêmico e que reconhece a insterseccionalidade das opressões vividas de forma diferente pelo conjunto das mulheres -- pode propor um projeto político democrático, libertário, pautado pelo bem viver e bens comuns para se opor a essa restauração conservadora?

Este Projeto Institucional para os anos de 2019 a 2022 sintetiza algumas respostas que vislumbramos para essas perguntas. Sabemos que nossa experiência acumulada nos anos de incidência política no Estado pelos direitos das mulheres e de construção ativa dos movimentos de mulheres e feministas contribui para a resistência ao contexto político em que estamos vivendo. No entanto, além disso, o atual momento político nos exige a capacidade de ecoar as vozes dissidentes – pró-justiça e reparação, igualdade e solidariedade – diante da guerrilha de mentalidades que estamos vivendo; e de construir e fortalecer os vínculos que tecem as redes, organizam as lutas e transformam o nosso modo de viver, de nos relacionar, de pensar estrategicamente e gerar mudanças.

Neste projeto institucional, compartilhamos os aprendizados de três décadas de trabalho em prol das lutas das mulheres; nosso olhar sobre a conjuntura atual; as linhas de ação, frentes de luta e métodos de trabalho que definimos para o período de 2019 a 2022; e a estratégia para o fortalecimento institucional da organização, apesar das ameaças crescentes de perseguição e criminalização das organizações da sociedade civil e das defensoras de direitos humanos.

O Programa “Mulheres em movimento por autonomia e igualdade: formação política, cuidado entre ativistas e incidência-resistência feminista” também inaugura um ciclo comemorativo importante para o CFEMEA, de celebração dos seus 30 anos de existência, com momentos de comemorações com ciclos de debates públicos, material midiático, publicações, entre outros.

2. NOSSO OLHAR SOBRE A CONJUNTURA POLÍTICA ATUAL

Avaliamos que o Brasil está imerso numa crise profunda. As últimas eleições não deixaram margem de dúvida sobre a força do fascismo na sociedade e no sistema político. O Brasil é parte de um cenário regional e internacional onde o contra-ataque conservador tem se realinhado ao ultraneoliberalismo para barrar as mudanças radicais produzidas no campo da sexualidade, dos direitos humanos, dos direitos civis da população negra, das mulheres e LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e intersexo) ocorridas no século XX. E para desmontar estados nações – via Golpes políticos - para impor lucro sem fim sobre vidas humanas, dizimando populações que vivem em territórios de disputa de mega projetos de “desenvolvimento”, para exploração de mineradoras, territórios também para expansão agropecuária e de monoculturas que ainda prevalecem como modelos econômicos que vão na contramão de modelos sustentáveis, que causam impactos severos ao meio ambiente e às populações locais, verdadeiras guardiãs da natureza e dos direitos de suas comunidades.

Os grupos religiosos cresceram nos Legislativos em todos os níveis e articulam propostas em todas as instituições contra os nossos direitos. Agrava esse contexto o fato de que o governo eleito de Jair Bolsonaro dá passos ainda mais fortes na aliança entre Religião e Estado, com 58 representantes religiosos neopentecostais fanáticos em suas estruturas administrativas (à exemplo da Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, a pastora Damares Alves). A frágil laicidade impressa em nossa Constituição Federal não vale mais nada.

O Governo Federal, com maioria no Legislativo e apoio em vários governos estaduais, também está pautado por uma agenda econômica que promove o desmonte de direitos, a privatização de bens comuns e a vigilância sobre a sociedade civil. Os mecanismos para a igualdade, de reparação racial e participação social estão sendo destruídos. Tudo com o apoio da mídia para passar uma ideia de normalidade democrática. E o principal combustível é a incitação ao ódio de toda natureza e autorização para a violência misógina, racista, elitista, LGBTfóbica, xenófoba na sociedade.

A boa notícia, que oferece alento no campo das resistências, é a ampla e diversa mobilização impulsionada por uma nova onda feminista e antirracista, que se revela na movimentação e organização das mulheres como sujeito político. Fomos às ruas pelo direito ao aborto em casos de estupro em 2015, com a Primavera das Mulheres – com a marcha das 150 mil mulheres negras e as Marcha das Margaridas das trabalhadoras rurais, já em sua sexta edição -- e lideramos as manifestações contra a candidatura de Jair Bolsonaro, na campanha #ELENÃO.

É na resistência que nós, mulheres, nos inspiramos para pensar o futuro. Para nós, é prioritário nutrir as raízes do feminismo antirracista e fortalecê-lo, contribuindo para a sua maior organização, articulação e fortalecendo sua capacidade de mobilização. Nos colocamos o desafio de responder à emergência de resistir, sem perder de vista o sentido radical das nossas lutas, sua dimensão latino-americana, perspectiva decolonial e metodologia orientada ao diálogo intercultural, seus princípios de autonomia, horizontalidade, reciprocidade, igualdade, justiça e reconhecimento mútuo, de forma a renovar nossa práxis política, seus referenciais teóricos e metodológicos, e nesse esforço construir estratégias para enfrentar a crise, construindo alternativas.

Essa luta não pode ser solitária, sendo fundamental uma articulação com o feminismo latino-americano e a construção de alternativas democráticas que aprofundem a luta contra as desigualdades e injustiças. Nos somaremos a ações globais de resistência, em solidariedade à luta de milhares de ativistas que estão sob risco de perseguição e criminalização em outros países.

3. ESTRATÉGIA CENTRAL

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Nossa estratégia é o fortalecimento do movimento feminista autônomo, crítico, criativo e antissistêmico - no enfrentamento ao racismo, ao patriarcado e ao capitalismo, de onde desdobram-se: a promoção do autocuidado e do cuidado entre ativistas; o aprimoramento dos processos auto-organizativos, de territorialização das lutas e de dinamização de convergências intramovimentos; a ampliação da participação das mulheres nas ações de resistência à ofensiva conservadora; a construção de alianças com outros movimentos; e processos colaborativos de produção de conhecimento e comunicação política.

Como objetivos gerais do Programa Institucional destacamos:

3.1. Promover o cuidado no ativismo, fortalecendo as capacidades de resistência individuais e coletivas e superando as divisões coloniais de pessoal/político, corpo/mente, natureza/cultura.

A formação feminista para o autocuidado e o cuidado entre ativistas ultrapassa a dimensão cognitiva do aprendizado, para envolver também a corporeidade (sensações, emoções e intuições) num processo vivencial e reflexivo de autoconhecimento, autotransformação e apropriação de métodos e técnicas para a promoção do cuidado coletivo. O método visa que se incorpore, se conheça e se viva outra experiência pessoal de convivência relacional, fora dos parâmetros ordinários, de maneira que cada ativista possa se conhecer mais, e também experimentar e inventar outros modos de viver e se relacionar, se transformar e transformar o mundo, a partir das realidades e dos contextos soberanos em que cada uma vive e atua.

3.2. Gerar ações colaborativas para processos de formação de ativistas, fortalecendo a iniciativa da Universidade Livre Feminista, a parceria com os movimentos e coletivos e a formação na ação de incidência política.

A formação política feminista é a metodologia adotada na Universidade Livre Feminista desde a sua origem colaborativa, centrada no diálogo, estudo e compartilhamento de práticas e reflexões coletivas. Busca-se promover o autoconhecimento, assim como o encontro, o cuidado e o acolhimento entre as participantes. A práxis educativa feminista é a sua base metodológica, com fortes referências na pedagogia de Paulo Freire, o que significa que acreditamos que o diálogo e a experiência dos sujeitos são geradores de um processo reflexivo e de autoconscientização voltado para uma ação transformadora da realidade. Nela, a experiência vivida a partir das relações sociais de gênero, raça, classe e sexualidade têm um lugar central, fazendo valer a máxima “o pessoal é político”.

3.3. Monitorar a ofensiva conservadora, fascista e antidireitos nas instituições dos Poderes públicos, em especial no Legislativo por meio de parcerias capazes de gerar informação estratégica e sistemática que subsidie a resistência e a incidência política.

A articulação política é uma via importante de organização e acumulação de forças entre as mulheres. Nos articulamos para expandir e fortalecer os movimentos de mulheres, mobilizar processos de resistência, autotransformação e transformação social, convictas de que transformamos o mundo na medida em que nos transformamos a nós mesmas e aos nossos movimentos. A nossa práxis política bebe da fonte do feminismo latino-americano, orientado a despatriarcalizar, desracializar e decolonizar o poder e as relações sociais. Firma-se nos princípios da horizontalidade, da auto-organização e autonomia das mulheres, do diálogo intercultural e do reconhecimento mútuo, da diversidade entre as mulheres e da igualdade de direitos.

3.4. Fortalecer a auto-organização, a articulação e a mobilização social – nacional e regional -- das mulheres, visando a sustentabilidade do ativismo feminista antirracista.

A comunicação política está direcionada à criação e difusão de conteúdos destinados a alargar os espaços na disputa de narrativa sobre direitos. Visa contribuir para a difusão de ações e posições feministas, campanhas e materiais de apoio à formação e à articulação em redes de artivismo e ciberativismo, no intuito de fortalecer processos de resistência e lutas feministas. O momento atual nos desafia a desenvolver novas estratégias de comunicação, mais seguras.

Anos de sofrimento, luta e resistência que devem marcar a vida de todas as pessoas, especialmente das mulheres, que acabam assumindo tarefas e jornadas duplas ou triplas no processo de reprodução social e que sofrem as várias formas de violência que marcam o sociedade misógina, patriarcal, racista e segregacionista. Mas, também são as mulheres que sustentam a resistência e as lutas pela sobrevivência e pela humanidade. É fundamental alimentar a luta de resistência e as lutas por respeito e garantia dos direitos, do direito ao seu próprio corpo, do direito à existência com liberdade e autonomia e dos direitos sociais, políticos, econômicos e sexuais.

Cfemea


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